Uma breve reflexão do texto de Celso Antunes sobre o ser ou não ser um "professor castor" e pagar o preço pela escolha...
O professor Castor, na opinião de seus alunos, era um bicho. Não por seu nome, menos ainda por sua braveza e certamente não era assim considerado por ser professor de Ciências, especializado em Zoologia. “Bicho” para seus alunos era apelido nobre e que expressava seu interesse e conhecimento, a paixão com que se entregava ao estudo e compreensão do mundo animal, enfatizando sempre que estes quase nada precisavam aprender com os homens e suas organizações, mas, por certo, teriam sempre muito que ensinar.
Mostrava aos alunos e mesmo aos colegas que o ouviam que o momento mais propício para buscas especiais e investidas mais solenes era sempre no exato instante da “onça beber água”, momento mais definido e crucial que a difusa hora “em que a porca torce o rabo”.
Mostrava nas ações do cotidiano de seus alunos, que era inútil sonhar com o momento do “jacaré nadar de costas” ou de tolamente esperar a “cobra fumar”, pois quem por essas ocasiões buscava acabava sempre, por certo, tendo que “pagar o pato”.
Não se limitava apenas a passar a matéria, pois indo sempre além, os ensinava a estudar, pesquisar, refletir e, não raramente meditar, lembrando sempre que os que assim não agiam acabavam descobrindo as imensas dificuldades similares as “da hora em que a vaca vai para o brejo”. Embora a maior parte de seus alunos respeitavam e gostavam muito do Castor, sabia que a unanimidade era improvável e que por certo haviam os que jamais tinham “algo a ver com o peixe” ignorando advertências e conselhos que não cansava de distribuir.
Ciência, dizia Castor, não era dogma e por isso acreditar na mesma significava questioná-la e questionar-se sempre, pensando no que os livros e os professores diziam sem fazer desse crédito confiança irrestrita, verdade inabalável. “Mesmo quanto toda ciência parecia querer firmar suas leis, lembrava Castor, não coma gato por lebre e assim ouse sempre com o beneplácito da dúvida, mais perguntar para melhor conhecer”.
Castor não representava unanimidade entre os colegas, nem era ilimitadamente aceito por todo corpo docente. Alguns até falavam “cobras e lagartos” a seu respeito, dizendo que essa sua mania de transpor o tema para orientar alunos ainda iria levá-lo a “dar com os burros n’água” e que “cão que ladra, nem sempre morde”. Mas, Castor, mesmo sabendo da oposição que às suas costas não poucos lhe faziam, seguia seu ritmo com a serenidade de coruja que sabe que a sabedoria não é herdada, mas que com a “perseverança de um touro” pode ser por todos conquistadas.
Professor diferente, personalidade singular sabia fazer dos temas que tratava textos e contextos para que sem se descuidar do saber, seus alunos soubessem perceber esse conhecimento na rua que atravessavam, nos programas que assistiam nas amizades que faziam. A fábula do “coelho e a tartaruga” ou mesmo a da “raposa e do corvo” se transformavam em capítulo da zoologia e daí se transpunha para a moral, para a filosofia, para a saberia do viver. Quando “estava com a macaca”, e sempre com a macaca esse Castor estava, substituía pontos de exclamação por desafiadores pontos de interrogação, ensinando seus alunos a refletir, mostrando que saber que realmente vale é saber que na vida se aplica.
Sorria de seus desafetos e não se importava dos apelidos que recebia. Seguia sua rota com a coragem do “leão”, a esperteza do “lobo” e os sonhos da “águia”, pois íntimo compreendia que “afinal de contas passarinho não come pedra”.
(Texto de Celso Antunes)
Um comentário:
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